24 setembro 2010

Água: Além do Debate Político

Eldo Silva dos Santos - Engenheiro Químico formado pela UNICAMP, Especialista em Gestão Empresarial pela FGV e Mestrando em Biodiversidade Tropical pela UNIFAP

O debate de candidatos ao governo do Amapá promovido pelas faculdades CEAP e SEAMA na 3ªfeira, 21/09, ainda reverbera nas rádios e no twitter, principalmente por conta de um tema: Abastecimento de Água.

O tema foi levantado pelo candidato Jorge Amanajás quando questionou o candidato Lucas Barreto sobre a solução “técnica” para resolver os problemas de abastecimento de água em Macapá. Na sua resposta, Lucas propôs a construção de uma estação de tratamento de água para a Zona Norte da capital com captação a partir dos Rios Pedreira ou Matapi e justificou sua proposta baseado numa melhor qualidade da água destes rios em relação ao Rio Amazonas e no desnível entre esta área da cidade e o Amazonas, que chega, segundo ele, a 35 m enquanto os rios citados estariam no mesmo nível ou até mesmo acima do nível da Zona Norte.

Discutiu-se amplamente desde então sobre a viabilidade da proposta de Lucas. Chegaram a chamar de non sense e mirabolâncias as proposições do candidato. Não concordo. Em um debate eleitoral, novas propostas são sempre bem-vindas e merecem que sejam discutidas para se ter a melhor solução para a população. Entendo que faz parte do jogo político discordar de tudo que os adversários políticos de momento apresentam afinal ninguém quer dar motivos para o outro se sobressair. Mas a discussão não pode ficar só no meio político.

Tecnicamente falando, têm-se algumas possibilidades para resolver o problema de falta de água em Macapá.

  1. Manter a atual estrutura, com a Estação de Tratamento de Água (ETA) do Beirol e 4 Sistemas Isolados (SI) – Perpétuo Socorro, Cuba de Asfalto, Cabralzinho e Congós é possível, mas serão necessários grandes investimentos em toda a cadeia produtiva da água tratada, ou seja, captação, modernização da ETA e dos SI, que estão praticamente sucateados, e na rede de distribuição que é antiga e com muitos vazamentos e incrustrações.
  2. Construir de nova ETA na Zona Norte com captação a partir do Rio Amazonas para abastecer os bairros daquela região enquanto a atual ETA e SI serviriam para abastecer os bairros do centro e da Zona Sul.
  3. Semelhante ao proposto na opção anterior mas com captação da nova ETA nos rios Pedreira ou Matapi, como proposto pelo candidato Lucas Barreto no debate.

Há outras possibilidades, mas ficarei na análise dessas 3.

Qual das opções é a mais viável? Não se pode afirmar sem dados técnicos conclusivos. Se há realmente o desnível significativo entre o Rio Amazonas e a Zona Norte, o custo de energia para a distribuição da água seria elevado pois se precisaria de bombas mais potentes. A opção 1, de manter a estrutura atual, requer grandes investimentos para recuperação do que aí está. Precisaria avaliar se esses investimentos são maiores ou menores do que construir uma nova ETA mais moderna e até mesmo mais compacta na Zona Norte.

Se os Rios Pedreira ou Matapi têm, realmente, elevação mais próxima a da Zona Norte isso representaria uma redução no consumo de energia, mas, em contrapartida, a distância entre o ponto de captação e a ETA pode eliminar essa economia.

Quanto à qualidade da água do Rio Amazonas e dos Rios Pedreira ou Matapi, é notório que nosso Rio Amazonas sofre muito mais pressões do homem que os outros dois rios visto que praticamente todo o esgoto de Macapá e Santana é lançado nele e com pouco tratamento. Outros parâmetros são importantes, como o pH, a turbidez, a cor, sólidos suspensos, ferro. Se os Rios Pedreira e Matapi apresentarem, em estudos detalhados, maior qualidade que o Rio Amazonas, a viabilidade de tal proposta se daria pela economia ao longo do tempo com a redução dos custos de aquisição de matérias primas para o tratamento (sulfato de alumínio, cal, cloro).

No Brasil, há vários exemplos de ETAs que fazem a captação em locais distantes por questões de uma qualidade melhor da água. Pode-se duvidar da capacidade desses rios menores em abastecerem nossa capital, mas, por exemplo, em Campinas-SP, o abastecimento é feito a partir do Rio Atibaia que é menor que esses nossos 2 rios e note que Campinas tem mais de 1milhão de habitantes. Macapá tem, perto de 500 mil.

Enfim, não se pode descartar nenhuma proposta. A escolha da melhor delas deve se da por critérios técnicos e sem paixões políticas. O embate político tem que se manter em bom nível e não se pode desprezar a inteligência dos eleitores ou explorar o desconhecimento dos leigos. Outra coisa que não se pode admitir é a patrulha sobre a opinião contrária. Ao se fazer isso, perde-se a oportunidade de enriquecer nosso aprendizado e de melhorar a vida do nosso povo.

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